EXISTE RELAÇÃO ENTRE VARIÁVEIS SOCIODEMOGRÁFICAS, CLÍNICAS E COMPLICAÇÕES PÓS-OPERATÓRIAS COM ADAPTAÇÃO EM PACIENTES ESTOMIZADOS?
Resumo
Existe relação entre variáveis sociodemográficas, clínicas e complicações pós-operatórias com adaptação em pacientes estomizados? Introdução: Uma das finalidades da profissão de enfermagem é promover a adaptação das pessoas à doença ou aos ciclos de vida, seja nas dimensões fisiológica, autoconceito, função papel e interdependência, a partir do manejo de estímulos focais, contextuais ou residuais. Assim, conhecer como as pessoas respondem ao adoecimento é essencial para orientar e viabilizar o processo de enfermagem, possibilitando o planejamento, a implementação e a avaliação em relação às suas necessidades adaptativas (Monteiro, Costa, Campos, & Monteiro, 2016). Portanto, conviver com uma estomia requer adaptação, positiva ou negativa, baseada na consciência e na escolha mediadas pela integração humana e ambiental. Assim, a adaptação é um processo dinâmico contínuo no qual o indivíduo tenta lidar com problemas relacionados ao estoma, aliviar emoções negativas e obter controle sobre os incidentes de vida causados pelo estoma (Roy, 2011; Ang, Chen, Siah, He, & Klainin - Yobas, 2013). Embora estudos na literatura nacional e internacional relatem que os enfermeiros devem avaliar continuamente a adaptação de pessoas com estomia, ainda são escassos os estudos que respondem a essa questão – assim como a ausência de evidências que enfoquem as formas de adaptação dos estudos e sejam identificadas complicações socioeconômicas, clínicas e pós-operatórias. É oportuno estabelecer a relação entre essas variáveis e os modos de adaptação e adaptação geral em indivíduos com estomias. Assim, investimentos nessa área são essenciais para garantir uma melhor adaptação dos preditores investigados. Nesse sentido, optou-se por investigar se há relação entre adaptação/modos de adaptação com variáveis socioeconômicas, clínicas e complicações pós-operatórias em indivíduos com estomias. Objetivo: investigar se existe relação entre adaptação/modos de adaptação e complicações socioeconômicas, clínicas e pós-operatórias em pessoas com estomia. Métodos: estudo transversal com 152 pacientes. A coleta de dados foi realizada no período de dezembro de 2017 a junho de 2018. Considerando que a média mensal de pessoas com estomia intestinal acompanhadas no serviço para avaliação de enfermagem foi de 25 pessoas, a amostra deste estudo foi de 150 pessoas com estomia. Os critérios de inclusão foram: ter idade igual ou superior a 18 anos e possuir estomias intestinais. O tempo de produção do estoma não foi determinado. Como critério de exclusão, estabeleceu- se que aqueles que não respondessem a todo o instrumento seriam retirados. No entanto, não houve exclusões. A amostragem foi por conveniência e consecutiva, ocorrendo à medida que esses pacientes se dirigiam ao serviço para receber material ou orientações com os cuidados com o estoma, sendo convidados a participar da pesquisa. Foram utilizados dois instrumentos: o primeiro foi utilizado para avaliar as variáveis sociodemográficas e clínicas, com questões que incluíam: idade, sexo, número de filhos, procedência, estado civil, escolaridade, profissão/ocupação, com quem reside, número de pessoas no domicílio, renda, diagnóstico, motivo da estomia, tipo de estomia e características da estomia, localização, diâmetro, permanência, quem realiza a troca da bolsa, características do efluente, tipo de bolsa e quantidade, adjuvantes utilizados, peso e principais complicações (Xavier, 2018). O segundo foi utilizado para avaliar a adaptação de pessoas com estomia, foi utilizada a Escala para o Nível de Adaptação do Estomizado (ENAE). O ENAE foi composto por 32 itens distribuídos em quatro domínios: modo fisiológico (com sete questões), autoconceito (com dezessete questões), função de papel e interdependência (ambos com quatro questões), mensurados por uma escala tipo Likert de cinco pontos. A consistência interna global desse instrumento foi medida por meio do alfa de Cronbach: modo fisiológico (? = 0,680), autoconceito (? = 0,899), função papel (? = 0,749) e interdependência (? = 0,793), valor de alfa global de 0,930. No teste e reteste, em termos de confiabilidade, foram observadas correlações entre 0,723 a 0,870, todas fortes e significativas (p<0,005), e em termos de precisão, verificou-se que os escores médios foram bastante semelhantes entre o teste e o reteste (Xavier, 2018). Para a obtenção do escore final do ENAE, os dados de cada dimensão são convertidos em uma escala de 0 a 128, com inversão nos valores dos itens 3, 9, 14, 16, 19, 22, 30 e 32. Os maiores escores revelam maior nível de adaptação da pessoa com estomia. Os autores consideraram os percentis de 25%, 50% e 75% para definir o nível de adaptação. Assim, valores entre 0 e 63 pontos, baixos; 64 a 95, média e ?96 pontos, alta adaptação. Inicialmente, os dados foram organizados no programa Microsoft Excel 2007® e posteriormente processados no Software Statistical Package for Social Sciences - SPSS versão 20.0®. As características sociodemográficas e clínicas das pessoas com estomias de eliminação intestinal foram analisadas por meio de estatística descritiva, frequência, média e desvio padrão. A associação entre características sociodemográficas e clínicas e complicações pós-operatórias com adaptação e seus domínios foi avaliada pelos testes t paramétricos de Student, ANOVA e correlação de Pearson e, ao violar seus pressupostos, seus equivalentes não paramétricos testes de Mann-Whitney, Kruskal-Wallis. Para todas as análises realizadas, adotou-se nível de significância de p <0,05. O estudo foi previamente submetido à análise do Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba e aprovado sob CAAE nº 80964717 4 0000 5188, parecer 2.562.857, em consonância com a Resolução 466/12. Resultados: a maioria dos participantes era do sexo masculino (50,7%), não brancos (65,2%), casados (48,7%), com dois ou mais filhos (64,5%), com até um salário mínimo (53,9%), com até oito anos de estudo (52,6%), católicos (63,8%) e aposentados (60,5%). A média de idade foi de 53,59 anos (DP = 15,56). Quanto ao tipo de estoma, 78,8% eram colostomia, com bolsa de peça única (50,7%) e permanente (51,3%). Complicações pós-operatórias foram relatadas em 76,3% dos participantes, destacando-se dermatite (64%), rubor (36,2%), extravasamento (16,4%), alergia (13,8%), hérnia (9,3%), retração (6,6%), prolapso (5,9%), prurido (5,9%), deslocamento mucocutâneo (3,3%), granuloma (2,6%) e edema (2%). A consistência interna geral foi de 0,90, obtendo valores nos respectivos modos: fisiológico (? = 0,64), autoconceito (? = 0,85), função de papel (? = 0,69) e interdependência (? = 0,54). O escore médio para o nível de adaptação foi de 53,72 ± 24,80 pontos, o que indica baixo nível de adaptação. Os participantes com baixo, médio e alto nível de adaptação representaram 65,8%, 27% e 7,2% da população estudada, respectivamente. Verificou-se que o estado civil esteve relacionado às diferenças de médias no modo fisiológico. Os participantes da união estável (15,50 ± 5,18) apresentaram médias superiores em relação aos viúvos (5,19 ± 3,01), que apresentaram médias menores (p = 0,005), semelhantes ao nível de adaptação total (p = 0,030). Observou-se ainda que, os níveis de adaptação total são independentes de sexo, idade, renda familiar, escolaridade e religião. Verificou-se que as pessoas com ileostomia apresentaram maiores médias em aspectos fisiológicos, autoconceito, função de papel, interdependência e adaptação total do que as pessoas com colostomia, apesar de não apresentarem significância estatística (p ? 0,05). Em relação às complicações, observou-se que as pessoas sem complicações apresentaram maiores médias nos modos fisiológico, autoconceito, função de papel, interdependência e adaptação total, porém sem apresentar diferenças estatisticamente significantes (p ? 0,05. Quanto ao tempo de estomia, diferenças estatisticamente significantes foram encontradas nos modos de autoconceito, função papel e adaptação total foram maiores nas pessoas com estomia permanente do que naquelas com estomia temporária. Observou-se que as pessoas reagem de forma semelhante nos modos fisiológico (p = 0,425) e interdependência (p = 0,891), apesar da permanência da estomia. Verificou-se que as pessoas com alergia apresentaram melhores níveis de autoconceito e interdependência do que aquelas que não desencadearam alergia. As pessoas com hérnia apresentaram menores médias nos modos de função, interdependência e adaptação geral quando comparadas àquelas que não apresentaram essa complicação (p <0,05). Em relação ao prolapso, houve diferença estatisticamente significante entre as médias baseadas na complicação e os modos de autoconceito, interdependência e adaptação geral (p?0,05). Conclusão: foi possível identificar fatores socioeconômicos, complicações clínicas e pós-operatórias que interferem no nível de adaptação. Os achados aqui encontrados mostram que programas de capacitação em enfermagem em reabilitação devem considerar que indivíduos sem companheiros, com estomas temporários, sem desfechos como alergia devem ser estimulados na busca de conscientização e integração humana e ambiental para melhorar sua qualidade de vida. Os resultados possibilitam identificar os grupos com menor adaptação, direcionando as intervenções de enfermagem para promover a adaptação a partir dos modos e manejo das complicações decorrentes da inserção do estoma, considerando a localização e o caráter da permanência da estomia. Nesse sentido, o enfermeiro pode direcionar o cuidado centrado no cliente e na família, fornecer informações sobre o manejo da condição clínica e da incapacidade e utilizar tecnologias de apoio que favoreçam a melhoria da qualidade de vida, como a irrigação intestinal e a oclusiva intestinal, favorecendo o autoconceito, a interdependência e a função de papel. O estudo contribuirá para a produção científica da enfermagem, uma vez que a literatura que fala sobre aspectos adaptativos em pacientes com estomias é escassa. Por meio dele, é possível compreender os fatores associados e as consequências de menores níveis de adaptação e estabelecer relações entre a adaptação e o desenvolvimento de complicações pós-operatórias.