REPOSICIONAMENTO DE FÁRMACO COMO ESTRATÉGIA ANTIMICROBIANA FRENTE A FERIDAS INFECTADAS:
UM ESTUDO DE SENSIBILIDADE A FLUOXETINA
Resumo
Introdução: Feridas de difícil cicatrização são aquelas que falharam no processo fisiológico de reparação dos tecidos, apresentando um processo de cicatrização retardado e, comumente, estagnado na fase inflamatória.¹ Com a abertura da pele, microrganismos da microbiota migram para o leito da lesão onde assumem papel de colonizadores, podendo multiplicar-se a ponto de tornarem-se agentes causadores de infecção. O tratamento com antimicrobianos é prescrito de forma empírica, até que haja dados laboratoriais para direcioná-lo. Contudo, a utilização de antimicrobianos, principalmente antissépticos, em pacientes com feridas sobreexcede o cuidado hospitalar e seu uso indiscriminado e/ou inadequado tem levado à seleção de cepas resistentes.² ³ Mesmo antimicrobianos tópicos de amplo espectro, como a Polihexanida biguanida (PHMB), já apresentam dados de resistência cruzada após exposição a concentrações subinibitórias.? Uma das estratégias utilizadas para minimizar os impactos da resistência é o reposicionamento de fármacos, que consiste em empregar compostos já utilizados na clínica com outra finalidade, quando esses demonstram eficácia.³ Nesse contexto, a literatura evidencia o efeito antimicrobiano e antibiofilme de fármacos da classe dos Inibidores Seletivos de Recaptação de Serotonina (ISRSs), como a fluoxetina.³ ? Dessa forma, faz-se necessário experimentos iniciais in vitro para avaliar sua eficácia antimicrobiana em cepas de microrganismos oriundos de feridas infectadas, visando a ampliação das possibilidades terapêuticas. Objetivo: Avaliar a atividade antimicrobiana da fluoxetina em cepas clínicas oriundas de feridas e abscessos. Método: Trata-se de um estudo experimental in vitro utilizando dezesseis cepas clínicas de Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa, sendo sete clínicas e uma ATCC para cada espécie. Para avaliar o efeito antimicrobiano da fluoxetina (20 mg/mL, EMS, Brasil), foi realizado sensibilidade planctônica por microdiluição em caldo, conforme preconizado pelo Clinical Laboratory Standards Institute (2021). Inicialmente, placas de 96 poços de fundo U foram preenchidas com 100 ?L de caldo Mueller Hinton. Em seguida, adicionou-se 100 ?L de fluoxetina na primeira coluna para realização da diluição seriada. Por fim, o inóculo bacteriano na escala 0,5 de Mcfarland foi adicionado aos poços da coluna 1 até a 11. A coluna 11 foi utilizada como controle de crescimento e a 12 como controle de esterilidade. O intervalo de concentração final da fluoxetina foi de 9,765 - 5000 ?g/mL. As placas foram incubadas em estufa bacteriológica a 37 °C, por 24 horas e a leitura foi feita de forma visual a fim de encontrar a Concentração Inibitória Mínima (CIM), definida como a menor concentração capaz de inibir 100% do crescimento bacteriano. Para validar o experimento, foi utilizado a cepa P. aeruginosa ATCC 27853 e o antimicrobiano clássico meropenem. Resultados: A fluoxetina apresentou CIM para todas as cepas testadas, variando de 19,5 - 625 μg/mL para S. aureus e de 78,125 - 625 μg/mL para P. aeruginosa. Os valores utilizados são seguros para uso e inferiores às doses terapêuticas utilizadas na clínica. Conclusão: A fluoxetina demonstrou ter propriedades antimicrobianas in vitro contra cepas clínicas de microrganismos comumente encontrados em feridas, mostrando seu potencial uso no manejo de feridas infectadas.