IRRIGAÇÃO TRANSANAL SIMPLIFICADA EM PACIENTES COM MIELOMENINGOCELE E INCONTINÊNCIA FECAL

RESULTADOS FUNCIONAIS APÓS TRÊS ANOS DE TRATAMENTO

Autores

  • MARCELA MONTEIRO PINHEIRO HOSPITAL DAS CLÍNICAS UFMG/EBSERH
  • BEATRIZ DEOTI E SILVA RODRIGUES HOSPITAL DAS CLÍNICAS UFMG/EBSERH
  • JAQUELINE ALMEIDA GUIMARÃES BARBOSA HOSPITAL DAS CLÍNICAS UFMG/EBSERH

Resumo

A mielomeningocele (MMC) é a espinha bífida aberta mais comum e mais grave. É uma malformação embrionária, um defeito congênito do sistema nervoso central, que ocorre nas primeiras quatro semanas de gestação, quando se tem o fechamento incompleto do tubo neural. Tem causas multifatoriais, ambientais e genéticas, sendo o tratamento complexo e focado na prevenção de complicações. A falta de função nervosa normal e a perda subsequente do controle sensorial e motor afetam significativamente o trato gastrointestinal inferior e a função colorretal. Essa disfunção intestinal neurogênica ocasiona trânsito colônico lento, prováveis alterações na motilidade colorretal, esfíncter anal anormal e função e sensação diminuída. Isso vem a afetar mais de 80% dos indivíduos com MMC, sendo que a constipação, Incontinência fecal (IF) ou a combinação de ambos gera um impacto negativo tanto na qualidade de vida (QV) tanto dos indivíduos quanto de seus familiares/cuidadores, gerando uma carga significativa nos orçamentos de saúde e aumento das taxas de depressão, ansiedade, bullying e diminuição da frequência escolar, entre outros. A incontinência fecal é definida como a perda involuntária de fezes e/ou a incapacidade de manter o controle fisiológico do conteúdo intestinal em qualquer momento da vida, por período de pelo menos três meses, após a aprendizagem do uso do banheiro, o que se dá geralmente aos 4 anos de idade. As estratégias iniciais de tratamento da IF e da constipação em pacientes com MMC se dão, geralmente, por modificação da dieta, laxantes orais ou agentes constipantes, supositórios retais, estimulação digital e terapias de biofeedback. Em parcelas significativas desses pacientes, esse manejo conservador não é eficaz e, quando essas ações falham, medidas intervencionistas são indicadas. A irrigação transanal (ITA) é uma alternativa terapêutica promissora, segura e eficaz e vem demonstrando eficiência em diferentes estudos de pacientes com intestino neurogênico. Vários estudos europeus mostraram a eficácia da ITA em pacientes com IF ou constipação, ocorrendo regularização na frequência evacuatória, menor IF e melhora na QV. Também em outros países com padrões socioculturais diferentes, como no Oriente Médio, têm sido observados bons resultados com a utilização da ITA em crianças com espinha bífida e IF. A ITA tem sido utilizada com sucesso no manejo desses distúrbios, porém o dispositivo utilizado, Peristeen®, não está disponível no Brasil. No país, a ITA simplificada foi padronizada utilizando o mesmo dispositivo via estomia, porém por via anal, se mostrou eficaz em pacientes com MMC e em pacientes com síndrome anterior do Reto (LARS), não acarretando efeitos adversos, quando bem indicada e executada. A ITA é, portanto, um recurso importante na reabilitação desses pacientes, uma vez que proporciona bom controle da função intestinal e melhora significativa da qualidade de vida. A técnica, realizada em ambiente domiciliar, consiste na utilização de um enema de água morna infundida a cada 24 horas, através do ânus que estimula a peristalse em massa e promove o esvaziamento do conteúdo fecal em um único momento, mantendo o cólon vazio por períodos mais longos. Nos pacientes com MMC, tem sido utilizada com objetivo de controlar a perda fecal involuntária, por meio de evacuações programadas, promovendo melhor readaptação às atividades habituais, inclusive as de convívio social. Objetivos: Avaliar a continuidade da ITA simplificada após três anos de capacitação de pacientes com MMC e incontinência fecal (IF) acompanhados no serviço. Comparar os resultados do impacto na função evacuatória e uso da técnica de irrigação simplificada. Identificar a ocorrência de complicações ou eventos adversos. Método: Estudo longitudinal e retrospectivo. Os pacientes e/ou responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). A pesquisa foi realizada de acordo com as recomendações éticas estabelecidas na Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS, 2013). O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (Coep/UFMG), com registro de Certificado de Apresentação e Apreciação Ética (CAAE): 04616818300005149. Os pacientes com diagnóstico confirmado de MMC e IF que não responderam a medidas conservadoras, como dieta, tratamentos farmacológicos, laxantes orais e fisioterápicos, foram treinados com a ITA simplificada de janeiro de 2017 a março de 2020 e avaliados quanto ao impacto da função evacuatória e qualidade de vida (QV). Nessa segunda fase do estudo, passados três anos dessa capacitação de introdução da ITA simplificada, foi realizada nova investigação com os mesmos pacientes e aplicado o questionário de IF Wexner, o protocolo I específico de MMC e um de procedimento prático (seguimento) a fim de verificar a continuidade do tratamento da ITA e o impacto na função evacuatória dos pacientes com MMC e IF, bem como os motivos da não adesão ao tratamento. Resultados: Dos 23 pacientes do primeiro momento do estudo, 20 permaneceram com o procedimento de irrigação transanal após os três anos. Os motivos para descontinuidade do tratamento foram: dores no joelho, dificultando o assentamento no vaso sanitário; internações prolongadas e um paciente por episódios frequentes de diarreia. Com relação a frequência da defecação 14 (70%) dos pacientes apresentam uma frequência de defecação diária e 6 (30%) conseguem ter frequência de duas a três vezes por semana. A defecação involuntária foi relatada por um paciente (5%) após três anos de ITA, e 95% não mais apresentavam perdas fecais ao longo do dia. Evacuação incompleta reduziu de 20% para 10% dos pacientes e 90% não mais utilizavam laxativos. Houve uma diminuição na taxa de incontinência anal de 7,00 para 6,00 na comparação de um ano para três anos de ITA simplificada (Escala de Wexner). Ao final de três anos de ITA, 60% desses pacientes não mais apresentavam perdas sólidas, 40% dos pacientes realizavam o procedimento sozinhos, sem ajuda, em comparação com um ano que foi de 15%. Dos 20 pacientes, 65% permaneciam em uso de proteção de roupa íntima devido a incontinência urinária. Com relação aos sintomas referentes ao procedimento de ITA, 30% relataram dor abdominal que seria o desconforto ao evacuar, 70% não apresentam nenhuma queixa e/ou sintoma e 85% relataram melhora máxima na qualidade de vida. Conclusões: Os pacientes que utilizaram a técnica de ITA simplificada após três anos de irrigação, mantiveram a técnica e não apresentaram dificuldades com o procedimento. A ITA simplificada é um método seguro, simples, eficaz, sem efeitos colaterais que contribuiu para a melhora da constipação e da IF em pacientes com MMC e IF. A técnica não resultou em complicações nem efeitos colaterais que ocassionassem a suspensão de tratamento. A enfermagem tem papel fundamental em educação, motivação, suporte e monitorização contínua desses pacientes a fim de resguardar a técnica adequada, bem como os ajustes no volume de água para evitar possíveis perdas fecais e conseguir uma adesão adequada ao tratamento.

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Publicado

2023-10-21

Como Citar

MONTEIRO PINHEIRO, M. ., DEOTI E SILVA RODRIGUES, B. ., & ALMEIDA GUIMARÃES BARBOSA, J. . (2023). IRRIGAÇÃO TRANSANAL SIMPLIFICADA EM PACIENTES COM MIELOMENINGOCELE E INCONTINÊNCIA FECAL: RESULTADOS FUNCIONAIS APÓS TRÊS ANOS DE TRATAMENTO. Congresso Brasileiro De Estomaterapia. Recuperado de https://anais.sobest.com.br/cbe/article/view/758