O CUIDAR EM ESTOMATERAPIA. INTERVENÇÕES NAS MANIFESTAÇÕES CUTÂNEAS ATÍPICAS POR CHIKUNGUNYA E NAS SKIN TEARS:
RELATOS DE EXPERIÊNCIA
Resumo
Introdução: Os presentes relatos de experiência, em formato de resumo expandido, procuram apresentar a importância da Estomaterapia como uma Ciência integrante do cuidado em Saúde. O primeiro relato envolve o vírus Chikungunya (CHIKV), um arbovírus reemergente que causa uma doença inflamatória musculoesquelética incapacitante em humanos, caracterizada por febre, poliartralgia, mialgia, erupção cutânea e cefaleia. O CHIKV é transmitido por espécies de mosquitos Aedes e é capaz de um ciclo de transmissão urbana epidêmica com altas taxas de infecção. Desde 2004, o CHIKV se espalhou para novas áreas, causando doenças em escala global, e o potencial para epidemias de CHIKV permanece alto. Embora o CHIKV tenha causado milhões de casos de doença e uma carga econômica significativa nas áreas afetadas, não há vacinas licenciadas ou terapias antivirais disponíveis1. A doença atípica é definida quando confirmada laboratorialmente e associada às manifestações neurológicas, cardiovasculares, dermatológicas, oftalmológicas, hepáticas, renais, respiratórias, hematológicas ou outras2. Já o segundo relato de caso contempla as Skin tears que representam uma condição comum de feridas traumáticas, que podem ser encontradas em algumas categorias de indivíduos nos extremos de idade, como bebês, crianças e idosos3. Também conhecidas como lesões por fricção são um problema importante para os pacientes e os profissionais de saúde que as tratam. Podem ser dolorosas, afetando a qualidade de vida e causando sofrimento ao paciente. Podem aumentar a probabilidade de hospitalização e prolongar o tempo de internação. As estimativas de sua prevalência diferem em todo o mundo de acordo com as áreas e cenários de atenção, mas há fortes evidências de que ocorrem mais frequentemente do que as lesões por pressão. A lesão traumática é causada por forças mecânicas, incluindo a remoção de adesivos em pele frágil. A gravidade pode variar em profundidade (não se estendendo pela camada subcutânea)4. Objetivos: Relatar a evolução do tratamento tópico de manifestações cutâneas atípicas nos membros inferiores na infecção aguda por Chikungunya e descrever a evolução da implantação de medidas preventivas e para tratamento tópico de Skin tears. Métodos: Estudo descritivo, tipo relato de casos clínicos. Caso 1: CAAE Nº 71132623.5.0000.5060. Paciente V.E.K., 64 anos, feminino, atendimento em domicílio, residente em Cariacica, Espírito Santo (ES). Portadora de hipertensão em tratamento. No dia 14/05/2023 apresentou queixa de febre alta (39,5ºC), dores no corpo e enjoo. Relata visita ao hospital no dia 16/05/2023, não sendo constatada quaisquer alterações no hemograma, liberada e prescrita medicação para controle álgico e febril. O aparecimento da primeira bolha ocorreu no dia 18/05/2023, sem a realização do cuidado tópico adequado. No dia 21/05/2023 recorreu novamente ao serviço hospitalar com o mesmo quadro queixoso somado à presença de bolhas no membro inferior direito (MID), no entanto, os resultados dos exames laboratoriais acusaram a doença de Chikungunya. Realizada infusão endovenosa de solução ringer com lactato e dipirona 1g, liberada com prescrição sistêmica de bromoprida (em caso de enjoo, 6/6H), paracetamol 150mg (em caso de febre, 8/8h) e solução fisiológica 0,9% (por via oral). Na manhã da mesma data, a paciente solicitou avaliação de um profissional Enfermeiro Especialista em Estomaterapia. Após consulta e devidas orientações educacionais, iniciou-se o cuidado tópico da pele íntegra dos membros inferiores (MMII), assim como da acometida por dermatose bolhosa com conteúdo translúcido. A limpeza foi realizada com compressas de viscose, estéreis contendo alantoína, Aloe vera, surfactante e cloreto de benzalcônio (1x/dia) e uso de solução 100% natural em spray aerossol contendo ácidos graxos do azeite de oliva extravirgem premium com alto teor de antioxidantes, oleocantal, hidroxitirosol, além das vitaminas A, D, E, F e K como curativo primário (2x/dia). Caso 2: CAAE Nº 71145323.0.0000.5060. Paciente L.R.P., 93 anos, feminino, atendimento domiciliar, residente em Vila Velha, ES. Portadora de hipertensão arterial sistêmica em tratamento. Nega insuficiência vascular em MMII. Presença de lesão traumática, tipo Skin tears em terço medial do membro inferior esquerdo (MIE), classificação tipo 2, com perda parcial do retalho cutâneo e de coloração alterada, não sendo possível reposicionamento. Pele perilesional inflamada, fragilizada, traumatizada e hiperemiada. Presença de dermatite ocre, principalmente nas extremidades, com fundo avermelhado, não dolorosa, e circundada por manchas senis. Formação de bolha com conteúdo sanguinolento próximo a face anterior do tornozelo. Devido à especificidade do tipo de lesão e seu correto tratamento, recorreu-se à avaliação e acompanhamento de um profissional de Enfermagem Especialista em Estomaterapia. Após consulta e avaliação foi realizado planejamento do tratamento, incluindo a prescrição dos de curativos especiais, orientações educacionais ao paciente e familiares e intervenções relacionadas à incorporação de acompanhamento multidisciplinar. O manejo da lesão e da bolha foram instituídos através da limpeza estéril da ferida, cuidados com a pele íntegra e perilesional com o uso de compressas de viscose impregnadas com alantoína, Aloe vera, surfactante e cloreto de benzalcônio; curativo pós trauma primário e/ou secundário composto por matriz cicatrizante lipidocoloide com fibras poli absorventes impregnadas com prata e de ação hemostática (troca realizada com 24 horas); gestão da umidade do leito da lesão respeitando-se o processo dinâmico da cicatrização por segunda intenção, tendo como recursos tópicos de uso posterior a primeira troca: gel contendo polihexanida (PHMB) 0,1% e ureia associado com membrana de biocelulose porosa e curativo secundário de silicone multicamadas com núcleo de poliacrilato de sódio superabsorvente, micro adesividade, não aderente; solução de ácidos graxos do azeite de oliva extravirgem premium com alto teor de antioxidantes, oleocantal, hidroxitirosol, vitaminas A, D, E, F e K que previnem a formação de radicais livres, criando um barreira protetora natural com as agressões externas, a fim de reduzir o risco de deterioração da pele, protegendo e restaurando e tonificando a epiderme e derme superficial acometida. Resultados Caso 1: A evolução do cuidado tópico da dermatose bolhosa é demonstrada na Figura A, período compreendido entre 21/05 a 28/05/2023, ocorrendo a absorção e/ou drenagem espontâneas das bolhas. A pele dos MMII permanecia íntegra, limpa e hidratada até 27/05/2023. No dia 28/05/2023, bolhas remanescentes se romperam, expondo ferida superficial. Foi utilizado como curativo primário gel contendo PHMB 0,1% e ureia, secundário composto de silicone multicamadas com núcleo de poliacrilato de sódio superabsorvente, micro adesividade, não aderente. A troca ocorreu após 48 horas (30/05/2023) alcançando-se a epitelização, assim foi retomada à prescrição inicial de cuidados com a pele íntegra através das compressas estéreis impregnadas com alantoína e Aloe vera; e posterior aplicação de solução de azeite de oliva, rica em polifenóis até a última visita, no dia 20/06/2023 (Figura B), trinta e três dias após intervenção de um Estomaterapeuta. Resultados Caso 2: A matriz lipidocoloide composta por fibras poli absorventes impregnadas com prata auxiliou na manutenção da umidade ideal, diminuição da carga microbiana local e promoveu ação de hemostasia. A recuperação do retalho cutâneo e cicatrização da lesão traumática por fricção se deu pelo uso do curativo primário de biocelulose porosa associada ao gel com PHMB 0,1% e ureia (apenas uma aplicação); gestão da umidade ideal através do curativo secundário de silicone multicamadas com núcleo de poliacrilato de sódio (trocada a cada 72 horas); limpeza da ferida realizada com as compressas de viscose estéreis impregnadas com alantoína e Aloe vera que auxiliaram na remoção do excesso de exsudato, manutenção da biocelulose porosa e cuidados com a pele perilesional e íntegra. Após 36 dias do início do tratamento, lesão encontrava-se praticamente cicatrizada com recuperação de um retalho cutâneo não reposicionável no leito da ferida e com alteração da cor, além da absorção natural e recuperação da integridade cutânea na área com bolha de conteúdo sanguinolento (Figura C). Conclusão: A área da Estomaterapia é ampla e abrangente, e para tanto faz-se necessário que o cuidado prestado tenha como fundamentos sólidas bases técnicas e científicas, para que o Estomaterapeuta possa contribuir deveras para a melhoria da qualidade de vida de pessoas com estomia, ou com ferida, ou com incontinência urinária ou anal (denominados problemas peculiares)5.