FATORES ASSOCIADOS AO USO DE DISPOSITIVO COLETOR CONVEXO
Resumo
Introdução: A confecção do estoma de eliminação fixado na parede abdominal leva a necessidade de uso contínuo de equipamento coletor e produtos adjuvantes para armazenar efluente intestinal e/ou urinário. A necessidade de uso contínuo de um sistema coletor gera desafios para o gerenciamento de danos à pele periestomal. Esse desafio é particularmente aparente ao tentar manter uma vedação eficaz e segura da pele, principalmente na presença de complicações. A seleção de um dispositivo coletor eficaz que se adapte ao redor do estoma e ao perfil do corpo periestomal é essencial ao lidar com as complicações da pele periestomal e/ou estoma. Os produtos que incorporam a convexidade costumam ser considerados uma ferramenta importante para atingir esse objetivo, citados como o meio preferido para gerenciar estomas planos ou retraídos e para compensar planos periestomais irregulares, como vincos ou dobras(1). Embora uma variedade de produtos convexos esteja disponível com diferentes profundidades e formas, existir um consenso sobre de dispositivos coletores convexos(2) e nos últimos anos foram desenvolvidas ferramentas que auxiliam o enfermeiro na tomada de decisão a respeito dos equipamentos coletores como Convexity Assessment Guide para a língua portuguesa(3) além do algoritmo para indicação de equipamento coletor para estomias de eliminação(4), há poucas evidências de suporte para orientar sua seleção e uso, persistindo a necessidade de compreender melhor os fatores que podem influenciar no uso do dispositivo coletor convexo. Objetivo: Analisar os fatores associados ao uso de dispositivo coletor convexo. Método: Trata-se de um estudo epidemiológico, observacional, longitudinal com abordagem de tendência temporal retrospectivo por meio de análise documental, fundamentada no Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE), realizado no Serviço de Atenção à Saúde das Pessoas Ostomizadas (SASPO), localizado em Fortaleza, Ceará. O estudo é recorte de um projeto guarda-chuva intitulado “Perfil sociodemográfico, clínico e epidemiológico e a associação de complicações de estoma e pele periestomal”. A coleta dos dados iniciou nos meses de agosto a novembro de 2020 e foi retomada em março de 2021, após novos decretos sobre distanciamento social referente a pandemia de COVID-19, sendo finalizada em dezembro de 2022. Foram selecionados prontuários ativos de pessoas com estomia de eliminação com intervalo de consultas de no mínimo seis meses para a capital e um ano para o interior. Para o levantamento dos dados foi criado um instrumento considerando aspectos sociodemográficos e clínicos. Os dados foram armazenados em banco elaborado no programa Microsoft Office Excel e analisados por meio do programa SPSS versão 26. Os dados foram explorados quanto às frequências absolutas e relativas e as medidas de tendência central e dispersão. Na fase analítica, para a detecção de fatores associados ao uso de dispositivo coletor convexo, utilizou-se a regressão de Poisson com variância robusta para obtenção de razões de prevalências (RP) que foram estimadas por pontos e por intervalos com 95% de confiança. O nível de significância adotado para o estudo foi p <0,05, sendo as informações apresentadas por meio de tabelas e confrontadas com a literatura nacional e internacional sobre a temática. O estudo foi submetido à avaliação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Ceará e aprovado com o CAAE: 09945419.4.0000.5534 e número do parecer: 3.345.417, obedecendo aos preceitos éticos referentes à Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Devido ao estudo utilizar dados secundários, empregou-se o Termo de Fiel Depositário. Resultados: Neste estudo, foram coletados 1946 prontuários de pessoas adultas, com idade média de 57,17 (DP: 17,38) anos. A maioria dos participantes residiam em Fortaleza (30,47%; n=593) e na região metropolitana Caucaia (28,16%; n=548). O quantitativo de 32,44 % (n=630) dos participantes faziam o uso de dispositivo coletor convexo. As principais causas de construção do estoma foram cancerígenas, sendo câncer colorretal (41,43 %; n=261), câncer de bexiga (20,48%; n=129) e outros tipos de cânceres (25,24%; n=159). Entre esses participantes, 13,81% (n=87) possuíam comorbidades. Predominaram pacientes que eram atendidos no serviço público (87,81; n=528). Os fatores associados ao uso de dispositivo coletor convexo, foi observado que as seguintes variáveis aumentaram o uso da bolsa convexa: estoma temporário (RP: 1,22; IC95%: 1,03 - 1,43); formato oval (RP: 1,19; IC95%: 1,03 - 1,37); localização no QSD (RP:1,23; IC95%:1,08 - 1,40); retraído (RP:1,14; IC95%:1,01 - 1,28); e efluente de consistência líquida (RP:1,18; IC95%:1,02 - 1,36). Recomenda-se o uso de cinto elástico para potencializar a convexidade. Entretanto, apesar de prescrito, poucos pacientes (45,9%) faziam uso contínuo desse adjuvante, desta forma sem associação significativa (RP: 0,83; IC95%: 0,82-1,25). Destacam-se como principais achados clínicos indicativos de dispositivo coletor convexo: presença de vazamento de efluente, complicações na pele periestomal devido aos vazamentos, movimentação do estoma na parede abdominal, alterações abdominais (vincos, dobras ou cicatrizes) e posição da abertura do estoma que prejudique a vedação. Apesar de possuir grau de recomendação B, estomias retraídas ou planas demandam o uso da convexidade, neste estudo não foi comprovado associação com estoma plano (RP: 1,15; IC95%: 0,99- 1,34). Destaca-se como algo novo, não apresentado pela literatura a consistência líquida (RP:1,18; IC95%:1,02 - 1,36) do efluente como fator para uso de dispositivo coletor convexo. Observou-se que as seguintes variáveis reduziram o uso da bolsa convexa: temporalidade indefinida (RP:0,76; IC95%:0,59 - 0,98); estoma baixo perfil (RP:0,76; IC95%:0,66 - 0,88); efluente de consistência pastosa (RP: 0,79; IC95%:0,66 - 0,93); complicação na pele (RP:0,90; IC95%:0,87 - 0,93); uso de adjuvante (RP:0,83; IC95%:0,79 - 0,87); frequência de troca diária (RP: 0,81; IC95%: 0,74 - (0,89); frequência até 5 dias (RP: 0,72; IC95%:0,60 - 0,86). A orientação de cuidados com estoma, pele periestomal e uso de dispositivo coletores reduziu a chance de uso de dispositivo coletor convexo (RP: 0,87; IC95%: 0,85 - 0,90). A demarcação pré-operatória da estomia reduz as complicações pós-operatórias e contribui para melhoria da qualidade de vida. Entretanto, não foi possível associar o fator estoma demarcado com o uso de dispositivo coletor, pois nenhum estoma foi demarcado, evidenciando fragilidade dos serviços de saúde no período perioperatório. Outra limitação foi o ângulo de drenagem que também não foi descrito em nenhum prontuário, logo não pode ser investigado. Acredita-se que a identificação e associação desses fatores possam contribuir na identificação e tomada de decisão para uso de dispositivo coletor convexo. Conclusão: Os principais fatores associados ao uso de dispositivo coletor convexo são: estoma temporários, formato oval, localizados no QSD, retraído e consistência do efluente líquida. Os Enfermeiros Estomaterapeutas estão preparados para orientar pessoas com estomias sobre o uso adequado da convexidade. Apesar de existirem ferramentas que auxiliam na tomada de decisão, deve-se levar em consideração outros fatores que podem influenciar, como realizar o exame físico em diferentes posições anatômicas. A convexidade contribui para reduzir vazamentos e melhorar o ajuste ao corpo, contribuindo para o conforto e a melhor qualidade de vida da pessoa com estomia.